Anunciados no último dia 4 de outubro, os vencedores do Nobel de Química de 2023 ganharam o prêmio pela descoberta e síntese de pontos quânticos — nanopartículas que são os menores componentes da nanotecnologia atual.
Camila Sastre, estudante paulistana da segunda série do Ensino Médio, também resolveu estudar essas partículas microscópicas. A jovem de 16 anos desenvolveu com os pontos quânticos um painel solar que é 15% mais eficiente na captação de luz e geração de energia elétrica. E mais: ela utilizou resíduos de mineração no projeto, o que o tornou ainda mais ecológico.
Com isso, a jovem levou o prêmio "Destaque em Inovação em Ciências e Exatas e da Terra" na FeNaDante, mostra de pré-iniciação científica do Colégio Dante Alighieri. A garota também irá competir na Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (Mostratec), que acontece de 23 a 27 de outubro na cidade de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul.
Tecnologia do Nobel
Apesar da ideia de Sastre se basear em pontos quânticos, sua pesquisa começou antes mesmo da divulgação do Nobel de química. A jovem já conhecia a tecnologia e tinha curiosidade em ver como essas nanopartículas funcionavam. "Eu me sinto muito feliz por ter desenvolvido um projeto que tem um assunto em comum com os laureados do Nobel de Química, pois isso valida a importância do meu projeto", ela declara, em entrevista por e-mail a GALILEU.
A aluna contou com a parceria da Universidade de São Paulo (USP), através do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), do qual sua orientadora, Juliana Izidoro, é pesquisadora-colaboradora. O professor Wayner Klën, também do Colégio Dante Alighieri, foi co-orientador do projeto de Sastre, e contribuiu com as medições da potência gerada pelo protótipo do painel solar.
Izidoro conta que a ideia de trabalhar com pontos quânticos foi totalmente da aluna. A estudante lhe apresentou diversas metodologias para a síntese desses pontos; porém, a princípio, a maioria delas utilizava materiais caros e elementos químicos mais nobres. Por isso, não parecia economicamente viável.
"Quando a Camila me mostrou uma metodologia simples que usava quitosana e ácido acético, que são materiais acessíveis, percebi imediatamente que dava para aplicá-la no laboratório de química do colégio", recorda a orientadora. "Quando conseguimos sintetizá-los com uma adaptação da metodologia da literatura e vimos que deu certo, ficamos muito felizes!"
Transformando rejeitos de mineração
O projeto para desenvolver o painel solar começou em 2022. Em sua pesquisa de materiais, Camila Sastre chegou a um meio obtido a partir de resíduos de mineração. A garota teve à disposição rejeitos do acidente ocorrido em Mariana (MG) com o rompimento da barragem de Fundão, em 2015.
A amostra utilizada pela aluna, que era rica em dióxido de silício, havia sido fornecida pela Mineradora Samarco em 2017, e fora armazenada no laboratório de química do Colégio Dante Alighieri. O resíduo foi convertido em silicato de sódio após três etapas: lixiviação ácida com ácido clorídrico, separação magnética e fusão com hidróxido de sódio (soda cáustica).
O silicato de sódio serviu como meio para que os pontos quânticos de carbono fossem dispersados e pudessem formar o material para a placa solar. Tais nanopartículas, por sua vez, foram sintetizadas com quitosana e ácido cético 10%.
Mas, na hora de fazer o acessório quântico funcionar de fato, houve vários momentos de frustração. Primeiro, a equipe usou uma placa com muito silicato de sódio; ela acabou ficando opaca e não cristalizou o produto de maneira uniforme. Na segunda tentativa, o silicato vazou das placas. Depois, em uma etapa de centrifugação, houve problemas na síntese dos pontos quânticos, e a amostra foi perdida.
Após inúmeras repetições, finalmente houve sucesso. Um protótipo criado por Sastre gerou 30,5 mW (miliwatts) de energia — cerca de 15% a mais que outros painéis de energia solar usados no laboratório do colégio, que produziram 26,5 mW.
"Percebi em minhas pesquisas que os pontos quânticos poderiam aumentar a eficiência dos painéis por meio do deslocamento do espectro de luz UV para dentro da faixa de absorção do painel solar", relata a estudante. "Quando conseguimos montar todo o sistema e vimos que a hipótese foi comprovada, ou seja, que a potência do painel foi aumentada, quase não consegui me conter de tanta alegria! Comecei a pular no laboratório e chamei todos para ver!"
A aluna paulistana, que se diz grande admiradora da química polonesa Marie Curie e que sonha em ser cientista desde o 6º ano do fundamental, planeja desenvolver uma versão do painel em tamanho real e com silicato de sódio e pontos quânticos distribuídos de maneira mais uniforme.
Os próximos passos também incluem fazer ajustes de vedação do sistema e testar o acessório em placas maiores. Além disso, serão simuladas condições reais, como exposição ao Sol, à chuva ou ao vento. "O objetivo é transformar este acessório em um produto que possa ser comercializado. E, caso ele funcione de maneira efetiva, nós pensamos na possibilidade de patenteá-lo", diz Sastre.